Toma Lá Dá Cá
(Ou a dificuldade em fazer um sitcom brasileiro)
(Ou a dificuldade em fazer um sitcom brasileiro)
Na metade da década de 90 um programa humorístico ousou desafiar os preceitos dos limites do padrão de qualidade global, com um elenco estelar de línguas afiadas. O uso da platéia e a interação com a mesma, quebrando totalmente a barreira da quarta parede, faziam o elenco do Sai de Baixo apresentar ao publico um humor totalmente novo e surpreendente para a época.
Mas então você se pergunta: Moura, se o titulo do post é Toma Lá Dá Cá, porque pícara você está falando do Sai de Baixo??
E a resposta é simples e você mesmo já deve ter respondido mentalmente. Toma Lá Dá Cá quer ser o novo Sai de Baixo.
A começar pelo elenco que traz Miguel Falabela e Marisa Orth. A continuar pela presença da platéia.
Mas tenho a impressão que a vontade, a principio, não era essa.
O programa tinha por intento, em seu inicio, ser uma sitcom com platéia, assim como é a maioria das séries americanas. Sim, já expliquei isso e repito. Sabe aquelas risadas que você ouve ao fundo nas piadas de Friends, Two And a Half Men e Big Bang Theory? Aquilo meus amigos, é a platéia.
A idéia inicial da série é muito boa. Mário Jorge (Falabela) era casado com Rita (Marisa Orth), mas separou-se dela e acabou por se casar com Celinha (Adriana Esteves), que por sua vez era casada com Arnaldo (Diogo Vilela), que após o divórcio acabou se apaixonando por Rita, e se casando com ela. Mario Jorge e Rita têm dois filhos, Tatalo (George Sauma) e Isadora (Fernanda Souza), e Arnaldo e Celinha são os pais de Adonis (Daniel Torres). Completando a família temos Copélia (a figuraça Arlete Sales), mãe de Celinha, e a empregada Bozena (Alessandra Maestrini). Completa o elenco a Sindica do condomínio Jambalaya, Alvara (Stela Miranda).
As duas famílias vivem em apartamentos vizinhos de porta, e isso, como diria o narrador da Sessão da Tarde, causa várias confusões.
O elenco também é bom. As estreantes na TV Alessandra Maestrini e Stela Miranda roubam a cena, ao lado de Arlete Sales. A empregada Bozena, uma paranaense cheia de histórias surreais sobre sua cidade, Pato Branco; a sindica sociopata Alvara, que rege o condomínio com mão de ferro; e a ninfomaníaca, alcoólatra e baladeira Copélia, que em nada lembra uma avó de verdade, são sem duvida os destaques do elenco. Perto deles o quarteto principal de estrelas globais fica quase apagado. Isso sem citar o elenco juvenil, que é a parte mais fraca do grupo, com destaque para Fernanda Souza que está, com o perdão da palavra, uma PATCHA GOSTOSA.
Como todo humor brasileiro, ou quase todo, TLDC se vale de bordões que caem no gosto popular, como o “Daí” de Bozena ou o “Prefiro não comentar” de Copélia.
Mas, e sempre tem um, mas, o grande problema do programa é exatamente o roteiro.
Enquanto Sai de Baixo se valia dos improvisos dos atores e a graça era que tudo era exatamente aquilo, uma grande brincadeira, o fato de Toma Lá Dá Cá manter a quarta parede por quase todo o tempo (e nem poderia ser diferente, ou as comparações seriam ainda mais fortes) exige uma melhor qualidade de roteiros. E falta exatamente isso.
Não existe uma linha de roteiro que siga em piadas e gags levando a um final, com uma trama amarrada, como vemos em Friends ou mesmo no brasileiro Os Normais. São apenas piadinhas, trocadilhos e comentários engraçadinhos amarrados por um fio muito fino de roteiro.
O elenco superlotado (chegando a 12 pessoas no fixo na segunda temporada) também prejudica, visto que alguns personagens só estão lá para constar e ganham uma linha de fala sem a menor relevância (ou sequer graça) apenas para não passar em branco.
Isso fica visível principalmente nos personagens Adonis e Deise, uma lésbica totalmente masculinizada vivida por Norma Bengell. Ambos não têm sequer uma trama pessoal, estão ali dentro apenas para marcar presença e em nada adicionam para o programa. A personagem Deise até era interessante, quando era apenas uma participação esporádica, mas a necessidade de colocá-la como recorrente acabou com a personagem que se tornou irrelevante. Algumas falas dedicadas a ela dão vergonha alheia.
Uma feliz aquisição ao elenco, esse sim, foi Ítalo Rossi como Ladir. Na primeira temporada ele era citado frequentemente, mas nunca fora mostrado. O marido de Alvara tinha costumes um tanto quanto peculiares, e sua estréia no primeiro episódio da segunda temporada é de chorar de rir. Ítalo construiu um personagem absolutamente non-sense, uma bicha louca cheia de testosterona, chocando quem é acostumado a ver o ator sempre em papéis sérios. É Mara!
Mas voltando ao problema. Os episódios têm em média 40 minutos de duração. Para uma comédia, muito tempo. Isso faz o roteiro ficar prolixo, gordo, com sobras. A necessidade de se explicar as piadas, a repetição das piadas, o exagero de falas desnecessárias... Falta tornar o roteiro enxuto, limpar um pouco, deixar realmente só que é engraçado.
Outro problema é a quebra da quarta parede. Existem três formas de fazer isso. A primeira é destruir a quarta parede e falar direto com o publico (como em Sai de Baixo). A segunda é quebrar de forma discreta, fazendo humor dessa sutileza (como em Scrubs). E a terceira é simplesmente não quebrar.
Toma Lá Dá Cá quebra e reergue a parede de forma tão sem critério que perde a graça. Fica forçado.
Dois exemplos disso:
Em um episódio, Aracy Balabanian faz uma participação como uma amiga de Copélia. Quando ela e Miguel Falabela se encontram, Miguel pergunta: “Já nos conhecemos?” – Aracy responde: “Seria de Yerevan?” – E Miguel finaliza: “Eu acho que é do Arouche mesmo...” – toca ao fundo a musiquinha do Sai de Baixo e a piada está ótima.
Mas sabe o que eu falei sobre estender demais a piada? Pois então. Marisa Orth entra em cena e estende a conversa com alusão ao antigo programa até o ponto de você pensar: TA, EU ENTENDI A PIADA.
Outro caso foi no episódio de ontem (21 de abril). Na semana passada, em um episódio que mostrava o destino de Ladir, um travesti vai a casa de Celinha dar noticias sobre o marido da sindica e acaba por descobrir que Deise é sua prima. As duas se abraçam e Marisa Orth comenta: “Um travesti e uma sapatão se agarrando na sala. É por isso que a gente não consegue merchandising”. Ok, piada legal, você ri pelo momento de interação entre o publico e o personagem. É tipo ler uma HQ do Deadpool. Porém no episódio de ontem, no qual a Hellmann´s estreou merchan, quase TODAS as piadas foram sobre isso. No mínimo do mínimo, idiota. Um episódio inteiro de TA, EU ENTENDI A PIADA.
Ainda tem a descaracterização que acontece com os personagens. Mario Jorge começou como um surfista despretensioso e irresponsável, mas hoje em dia Miguel o interpreta como se fosse... Caco Antibes. Picareta, chamando a empregada de serviçal, ganancioso. Parece que é ator de um personagem só, o que não é o caso, claro, visto o talento reconhecido do mesmo. Mas aparentemente é mais fácil tentar conquistar a audiência com uma fórmula pronta do que tentar inovar.
A temporada tem mais de 30 episódios, e em meio a momentos hilários, tem muita, mas muita, encheção de linguiça.
A terceira temporada estreou, e continuarei acompanhando por simpatizar com a performance de alguns dos atores.
Mas ainda tenho ressalvas e me pego pensando toda a vez que assisto: Será que nunca teremos um roteiro de humor decente no Brasil? E ainda... Penso como TLDC poderia ser muito, mas muito melhor. Assim como todo o humor brasileiro.
Até o próximo episódio galera.
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