“É, o segundo grau foi foda. Aí a gente se formou e todo mundo começou a ter empregos, casar, ter filhos e todas essas coisas estúpidas.”Stifler
Quando saíram as notícias de que American Pie ia ter um “episódio reunion” (que, em séries e filmes americanos é na verdade um tema bem clichê) com todo o elenco original, eu parecia ser a única pessoa que estava interessado (e provavelmente era mesmo uma das únicas, pelo menos entre os nerds). Quando o primeiro American Pie saiu aqui, eu estava entrando na faculdade. E, ao contrário do que aqueles que me conhecem de poucos anos para cá podem pensar, eu era bem diferente de um “nerd típico” no segundo grau. E, por diferente, eu quero dizer que era um adolescente comum, "normal", que falava bobagens no meio da aula, que ia para a direção por fazer besteiras, e até se dava relativamente bem com as garotas (embora naquela época você está tão preocupado em pegar gurias que nem pára pra pensar se é bom ou ruim nisso – a menos que você não pegue ninguém, é claro). O segundo grau (como era chamado “na minha época”, agora é ensino médio) para mim foi o máximo, a melhor época da minha vida sem dúvida alguma. Foram 3 anos e que eu conheci muitas pessoas diferentes, aprendi muito, viajei e festei à beça. Sim, eu sei que isso não condiz em nada com a visão do nerd que as pessoas têm de mim, mas assim que se sucedeu*.
A partir do parágrafo acima, dá para imaginar que eu facilmente me identifiquei com os personagens do primeiro American Pie como, imagino, a maioria dos jovens da minha época. É claro que depois o filme virou uma franquia, tendo uma segunda e terceira partes, e para mim encerrou aí (as outras continuações, diretas para DVD e sem o elenco original eu não conto). Foi uma trilogia que aconteceu em uma época em que eu passava (ou havia recentemente passado) por situações que poderiam ser consideradas análogas. No fim das contas, para mim, American Pie, por trás de todo o humor e escatologia, sempre foi sobre o quão complicado e traumático é crescer.
American Pie: O reencontro (American Reunion) chega para mim como a consolidação final dessa declaração: Se eles achavam complicado crescer, como é viver o resto da vida como adultos? E mais uma vez o filme traz uma trama com a qual eu posso me identificar: Depois de tudo o que passaram, cada um dos personagens seguiu com suas vidas e há muito deixaram de ser adolescentes, sendo agora pessoas responsáveis (ou o mais próximo disso que se permitiram) e às voltas com as obrigações da vida de adulto. E é nesse clima que os personagens, ao se encontrar para a reunião da turma deles do colégio, vão poder relembrar seus tempos de segundo grau e, consequentemente, confrontar-se com suas realidades atuais.
É claro que o filme não exala esse discurso de forma dramática, e sim tirando sarro. Mas a melancolia, apesar de sutil, é visível em alguns trechos do filme. Primeiro porque ele busca prestar homenagem ao filme original, então há a releitura (para não dizer repetição) de algumas gags clássicas, como Jim colocando uma tampa de panela quente nas suas partes baixas e, é claro, diversas sequências escatológicas que, embora na época do original eu não tenha me incomodado, hoje soam um pouco forçadas. Mas acho que a intenção era justamente essa, confrontar o humor “idiótico” adolescente com um pensamento mais “maduro” (e que fique claro que uso a palavra maduro aqui de forma bem genérica). Segundo porque o filme, apesar de escrachado, leva a vida dos personagens para um realismo cru, ou seja, mostrando que a vida de adulto é uma merda (o que é mesmo, mas para não ser totalmente injusto, o fato de poder falar sobre, fazer e ver sexo sem repreensão, além de poder comprar as próprias coisas com seu próprio dinheiro são grandes méritos da vida de adulto). Mas, além disso, o filme brinca com vários aspectos da vida adulta, como o clássico “nossa geração era bem mais madura que os adolescentes de hoje”, até coisas como, ao analisar o “anuário com as frases que os garotos deixaram sobre o que queriam para o futuro, descobrimos que Jim tinha escrito “Que eu tenha a vida sexual do Ricky Martin” (brincando com o fato de que, à época, ele era visto como um pegador de mulheres e não havia se assumido gay). Sem contar que há algumas “trocas” de brincadeiras do primeiro filme que, por mais clichê que pareçam, soam até bacanas dentro da proposta do filme.
Todos os personagens do original estão de volta, inclusive os coadjuvantes, nem que seja para terem cenas descartáveis (e alguns têm mesmo). Mas o elenco principal (que eu conto Jim, Kevin, Oz, Finch, Stifler, Michelle, Heather, Vicky e o pai do Jim) está todo lá e interage de forma bem bacana, justamente mostrando o contraste de quando eram apenas adolescentes com suas vidas atuais. Minha única grande reclamação, não sei se é porque hoje em dia eu reparo mais nessas coisas do que quando era jovem, é que o filme é demasiado machista: Não porque mostra mulheres seminuas (isso é muito bom), mas porque deixa de lado as histórias pessoais das mulheres do grupo, focando-se no grupo de amigos. Realisticamente falando, se é que podemos dizer isso, até faz sentido, porque, até onde eu me lembro, as garotas não eram amigas como os garotos eram, e a história é sobre o reencontro de amigos. Mas, mesmo assim, ficou meio chato deixar apenas os homens como guias para a história, pois ficou parecendo que as mulheres não tinham tanta importância. Ou sei lá, talvez eu esteja vendo coisas onde não há nada (esse é outro problema de se tornar adulto, se preocupar demasiado com coisas desse tipo).
Mas, antes que vocês resolvam assistir o filme por causa da minha resenha (tudo bem que isso é colocar fé demais no texto e na minha capacidade de persuasão, mas enfim), o filme não é nada demais. Ele não mostra nada de novo, nem tem um roteiro inteligentíssimo nem piadas inéditas. Ele é, sim, um “acerto de contas” com os fãs da cinessérie (existe isso?) e com os personagens, e uma forma de dar um “devido adeus” para eles (embora o final ensaie possíveis sequências).
No fim das contas American Pie – O reencontro está para os fãs da cinessérie como Toy Story 3 esteve para os fãs da cinessérie dos bonecos: É um filme muito específico, feito para quem tinha a idade certa na época em que os filmes foram lançados. E que, por conseguinte, tem a idade certa para identificar-se com os personagens e com tais períodos de suas vidas agora.
E, considerando minha atribulada vida atual, o filme veio em boa hora para permitir que eu possa rir um pouco junto com personagens que eu conheci há muito tempo e, porque não, rir um pouco de mim mesmo.
*Mas não pensem que por isso eu não era nerd de fato; já era fã de quadrinhos, filmes, séries, colecionava coisas, e tal. Mas isso era algo que sempre guardei para mim até sair do colégio. Não que eu sofresse preconceito com isso, pelo contrário: nos lugares onde estudei meus colegas sempre foram tranquilos quanto a esses assuntos, mas como não fazia parte da realidade da maioria, acabava deixando isso de lado para interagir com outras coisas que eu também gostava e que a maioria das pessoas compartilhava.